08 dezembro 2009

Currículo Oculto e Fazer Docente

Na minha época de estudante, quando estava na sétima série do Ensino Fundamental, escutei certa vez um professor dizer: “É ruim que vou levá-los ao programa ‘É Proibido Colar’. Vocês estão bagunçando demais. Não prestam atenção nas aulas”. A partir daquele dia, a classe inteira mudou de atitude. Todos começaram a prestar mais atenção nas aulas daquele professor e a realizar as atividades e entregar os trabalhos pedidos. Tudo isso porque todos queriam ir ao programa de televisão da TV Cultura. Afinal, o “É Proibido Colar” era um programa muito divertido que reunia música, gincanas, entrevistas. Era considerado, na escola que estudei, o sonho de consumo de todos os alunos , isso nos idos dos anos de 1980.

A atitude daquele professor pode ser citada como um exemplo de Currículo Oculto. A partir daquelas palavras quase mágicas, os alunos passaram a se dedicar aos estudos de sua matéria. As aulas ficaram mais silenciosas e os alunos realmente passaram a aprender mais.

Podemos definir Currículo Oculto como sendo “comportamentos, atitudes, valores, orientações, que tem como intenção fazer com que as crianças e jovens se ajustem a determinados padrões de comportamento levando ao conformismo, a obediência e ao individualismo” [1] . Por outro lado, a prática do Currículo Oculto pode ser vista de forma positiva também. Para Josefa Sônia Pereira da Fonseca, doutoranda em Educação, “sua prática se dá pela percepção que o professor desenvolve no exercício de sua profissão de que é preciso atingir com precisão o seu objetivo (...), além das fronteiras das metodologias, formas próprias para alcançar a aprendizagem de seus alunos marcando-os não apenas o seu intelecto mas, sobretudo a sua afetividade” [2].

Fonseca realizou um estudo, onde mostrou que alunos cujo professor de matemática, no ensino fundamental, conseguia despertar no aluno a criatividade, a espontaneidade e o respeito, obtiveram maior sucesso na aprendizagem dos alunos, inclusive no prosseguimento dos estudos, já a nível universitário.

No dia a dia do fazer docente percebemos nitidamente o uso do Currículo Oculto: Professores que deixam os alunos chupar balas em aula, mesmo sendo proibido pelas regras da escola; Professores mais rígidos com seus alunos que ameaçam suspender as aulas de educação física caso a turma não realize as atividades propostas; Professores que conversam e tentam entender os problemas pessoais e familiares de cada aluno, aproximando-se deles e relevando certas dificuldades pontuais em beneficio da turma inteira; Professores que conseguem mostrar ao aluno a importância da dedicação, deixando claro que muitas vezes os resultados não são imediatos, mas acontecem em longo prazo, como, por exemplo, ser premiado no Concurso Regional de Matemática, ou participar de uma exposição, como monitor, no principal centro de convenções de sua cidade.

Os exemplos citados acima mostram que existe uma série infinita de relações entre alunos e professores onde o currículo oculto este embutido. Para Catarina Iavelberg, especialista em psicologia da educação, as ações, dentro da perspectiva do currículo oculto, só serão eficazes “quando contribuírem para melhorar a qualidade do ensino e da aprendizagem” [3].



[1]- Apostila da disciplina Currículo: Teoria e Prática, pg. 61.

[2]- FONSECA, Josefa S. P. A PRÁTICA DO CURRÍCULO OCULTO NAS AULAS DE MATEMÁTICA NA ESCOLA FUNDAMENTAL E SUA INFLUÊNCIA NA FORMAÇÃO DO ADMINISTRADOR: UMA PESQUISA EXPLORATÓRIA. Disponível em: http://www.spce.org.pt/sem/Montegordo/15XV.pdf . Acesso em: 25/10/09.

[3]- IAVELBERG, Catariana. CURRÍCULO OCULTO. Disponível em: http://revistaescola.abril.com.br/gestao-escolar/orientador-educacional/curriculo-oculto-448775.shtml. Acesso em: 25/10/09.
Filosofar: Base de uma Educação de Qualidade

Segundo Antonio Gramsci em toda atividade humana está contida uma concepção de mundo e se todos têm uma concepção de mundo, todos filosofam, mesmo que isto ocorra de forma inconsciente. Em outras palavras, todo ser humano é filósofo, uma vez que todos pensam ou podem pensar o mundo de forma particular, quase que única. Porém, esse pensar o mundo não se limita sempre a ter idéias próprias, muitas vezes, a concepção de mundo está intimamente ligada ao que os outros pensam, ou seja, uma concepção de mundo imposta. Para Gramsci essa postura deve ser evitada e todos deveriam elaborar sua própria concepção de mundo. Neste ínterim aparece a afirmação de que a filosofia é algo difícil, quando as pessoas param de pensar por conta própria e passam a incorporar idéias impostas por outrem e passam a viver a vida como se todas estas idéias fossem verdadeiras, elas se sentem, muitas vezes, incapazes de pensar por conta própria, desconfiando, inclusive, de suas próprias idéias. Daí acreditar que filosofar é uma atividade intelectual que deve ser feita apenas por cientistas profissionais.

As idéias de Gramsci vêm complementar os pensamentos propostos por John Dewey em sua concepção de educação. Para Dewey, a educação deve ser vista como um processo onde se busca formar disposições fundamentais, intelectuais e emocionais nos seres humanos em relação à natureza e aos outros seres humanos. Assim sendo a filosofia seria ou deveria ser a teoria geral da educação.

Ao se acreditar que, com a educação, pode-se desenvolver nas pessoas formas fundamentais de pensar e agir, bases intelectuais reflexivas, o aperfeiçoamento cognitivo, certamente que se está desenvolvendo nelas uma forma particular de ver o mundo. Ou seja, nesta visão, a educação contribui para desenvolver nas pessoas uma concepção de mundo. E se isto ocorre, é porque dentro de todo esse processo intelectual, cognitivo e emocional, os atributos da filosofia estão sendo utilizados.

Em sala de aula, quando professores trabalham seus conteúdos de forma reflexiva e crítica, certamente que estarão utilizando o método filosófico. Portanto, dentro da perspectiva da educação, é em sala de aula que se pode nitidamente perceber a função da filosofia. Ao se refletir sobre as condutas morais e intelectuais nas diversas situações que o ser humano perpassa, a filosofia está sendo feita.

Portanto, concordo com a visão de Dewey quando afirma que a filosofia pode ser definida como a teoria geral da educação, as pessoas aprendem de fato, quando refletem, quando contrapõem opiniões e visões de um mesmo assunto e, sobretudo, quando chegam às suas próprias conclusões. Portanto, a filosofia pode ser considerada como a mola mestra da educação, com ela é que é possível se fazer uma educação de qualidade, melhorando o aprendizado dos alunos e contribuindo para a formação de cidadãos críticos e que tenham uma postura mais participativa em nossa sociedade.
Mérito ou politização: Para onde vai a qualidade dos serviços em Educação?

Ricardo Navia, professor doutor da Universidad de La República, de Montevidéu no Uruguai, critica a estrutura educativa das escolas em dois pontos importantes: em primeiro lugar, quanto ao poder de decisão que os chamados funcionários políticos possuem em detrimento dos docentes e supervisores de carreira, sendo aqueles mais sensíveis às pressões do poder em detrimento destes. Num segundo momento, chama a atenção para a existência de uma distorção da carreira docente, na medida em que os altos cargos de supervisão e planejamento não são ocupados através de concurso de méritos intelectuais, mas sim por planos impostos ou pelos chamados “méritos administrativos”.

Para Navia, que é doutor em filosofia da educação, os chamados funcionários políticos estariam ocupando cargos mais altos exatamente porque são mais sensíveis às pressões do poder, ou seja, seguem à risca determinações impostas por quem tem o poder político e, assim, acabam conseguindo benefícios e ocupando cargos mais elevados, em detrimento dos funcionários de carreira que estariam mais voltados para os interesses das comunidades escolares e, portanto, não se deixariam levar com tanta ênfase pelas pressões políticas.

Por outro lado, quando um cargo é ocupado por motivos políticos e não por méritos intelectuais, a tendência é encontrar funcionários que se preocupam em agradar quem esta no poder e não fazer o seu serviço visando melhorias em prol da qualidade da educação. Ou seja, atende-se ao interesse de uma minoria que detém o poder e se esquece das necessidades de quem faz uso do sistema educativo em busca de qualidade. Portanto a politização dos cargos na área da educação pode levar à queda na qualidade dos serviços oferecidos e conseqüentemente uma queda na qualidade da educação.

Sob meu ponto de vista, é necessário que a estrutura educativa seja repensada e em muitos casos, modificada. Os cargos em educação não podem ser ocupados apenas por questões políticas, é necessário que haja uma abertura para a contratação de funcionários por méritos intelectuais e que tenham a preocupação em oferecer serviços de qualidade sempre buscando a melhoria da educação. A politização dos cargos em educação é preocupante, sobretudo porque seu objetivo final é beneficiar uma pequena parcela de pessoas em detrimento do interesse da maioria.
Educação no Brasil: Ensino Elitizado e sua Universalização

Em seu artigo “As Origens da Educação no Brasil – Da hegemonia católica às primeiras tentativas de organização do ensino”, Marcos Marques de Oliveira, doutorando em Educação, ensina-nos que a educação no Brasil sempre esteve voltada para o ensino das elites em detrimento da universalização do ensino popular. No período da economia agroexportadora, a educação voltou-se para a formação da elite, visando prepará-los para exercer profissões liberais e atividades político-burocráticas. Na passagem para o modelo econômico urbano-industrial, que culmina com a Revolução de 1930, as classes média e popular passam a reivindicar uma organização de um sistema nacional de ensino.

Desta forma, a escolarização passa a ter destaque na dinâmica dos conflitos sociais. A então progressiva organização da estrutura educacional brasileira passa por três momentos marcantes: expansão da demanda social (Primeira República), as reformas Francisco Campos e Gustavo Capanema e a promulgação da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação nacional em 1961.

Apesar do incremento da presença das camadas populares dentro da escola nos momentos citados anteriormente, é somente durante a gestão do presidente Fernando Henrique Cardoso, na década de 1990, que o ensino fundamental passa, de fato, a ser estimulado e ampliado. Neste momento que, efetivamente, as camadas mais pobres passam a freqüentar as salas de aula e nelas permanecer. Porém, o grande desafio que permanece até os dias de hoje, além da inclusão das camadas mais pobres nas escolas, está na melhoria da qualidade dos serviços prestados, ou seja, não basta mais que as camadas populares estejam na escola e permaneçam nelas, faz-se necessário agora melhorar a qualidade de ensino e, sobretudo, é preciso que os alunos realmente aprendam. Com a melhoria no quadro sociocultural de nossa população como um todo, poderemos assim construir cada vez mais uma nação mais justa, produtiva e democrática.